Com a volta da importação de carne bovina brasileira para a China, suspensa desde setembro, a Minerva (BEEF3), maior exportadora da proteína na América do Sul, irá retomar imediatamente seus embarques nas plantas brasileiras para o país asiático, que tem “uma capacidade de crescimento muito forte” em seu consumo, contou Danilo Cabrera, Head de Relações com Investidores, em entrevista ao Mercado News. “A demanda por carne bovina tem crescido em uma velocidade que a oferta não acompanha”, disse Cabrera sobre a Ásia e o Oriente Médio.
Além disso, segundo o executivo, o mercado asiático é o maior consumidor global de ovinos, o que geograficamente se alia à sua recente aquisição de duas unidades frigoríficas na Austrália especializadas nestes animais, que poderão alcançar a capacidade de abate de 1 milhão cabeças por ano.
“Eu operando Argentina, Uruguai e Austrália, tenho capacidade de arbitrar ainda mais dentro dos mercados”, contou Cabrera sobre o mais novo passo do plano de diversificação geográfica da empresa que opera também, além dos citados, no Brasil, Paraguai e na Colômbia. De acordo com ele, a estratégia reduz e diversifica riscos, permitindo capacidade de arbitragem operacional e financeira, o que se provou no terceiro trimestre de 2021 quando a China ainda não estava recebendo carne bovina brasileira, mas continuou sendo atendida pela Minerva em plantas na Argentina e no Uruguai.
No período, a Minerva registrou lucro líquido de R$ 72,4 milhões, crescimento de 24% na comparação anual e totalizando R$ 449 milhões no acumulado do ano. Para Cabrera, não se deve esperar um quarto trimestre muito diferente do anterior, em que o cenário de exportação segue firme e atrativo e “com uma demanda por carne bovina bastante forte, especialmente da Ásia e do Oriente Médio”.
A seguir, leia a entrevista completa:
Mercado News – Como a Minerva vê a retomada das exportações de carne bovina do Brasil para a China? De que forma isso a impacta no início do novo ano?
Danilo Cabrera – China segue um cliente relevante para a nossa empresa e, nos últimos meses, estava sendo atendido por nossas plantas habilitadas para exportar ao mercado chinês, localizadas na Argentina e no Uruguai, em linha com a nossa diversificação geográfica. Com a confirmação da suspensão do embargo, as nossas plantas brasileiras habilitadas para exportar à China retomarão imediatamente os embarques de carne bovina ao País.
Mercado News – Poderia falar um pouco sobre os planos de diversificação geográfica da companhia?
Danilo Cabrera – Entendemos que no nosso negócio, diversificação de risco ocorre por meio de diversificação de geografias. Na nossa avaliação, ter um footprint operacional espalhado em regiões produtoras e em que você tenha também vantagens competitivas na matriz de produção – que é o caso muito claro da América do Sul – reduz e diversifica riscos, permitindo capacidade de arbitragem, operacional e financeira.
Posso simplesmente tirar proveito das condições do animal, em determinada região, do ciclo pecuário, das condições de mercado e acelerar, desacelerar a operação. Arbitrar o mercado da maneira que seja mais eficiente para a companhia como um todo. Por isso que temos bastante confiança nessa estratégia de diversificação geográfica como um agente mitigador de riscos muito grande.
Falando um pouco sobre a produção de carne bovina na Austrália. Por mais que a Austrália esteja passando no momento por dificuldades, ainda assim estamos falando de um país que sempre expôs entre segundo e terceiro maior exportador do mundo. Então a Austrália tem essa oportunidade de a companhia ampliar ainda mais essa estratégia de diversificação geográfica e o mercado que tem uma tradição brutal na produção, exportação de carne bovina, reconhecido mundialmente por ser um produtor de carne premium. Ele se coloca em uma prateleira superior junto com Argentina, Uruguai, o que adiciona um fator ainda mais positivo para a nossa estratégia de arbitragem. Eu operando Argentina, Uruguai e Austrália, tenho capacidade de arbitrar ainda mais dentro dos mercados. Tem também o benefício geográfico. O benefício logístico de estar próximo de um grande vetor de consumo que é a Ásia.
O início da nossa operação na Austrália está correlacionado com esse passo na operação de ovinos. Tem toda uma estratégia por trás. O mercado asiático também é o maior consumidor global de ovinos.
Uma iniciativa também é uma parceria [joint-venture] com a Salic, que é um grande investidor da companhia. E o Oriente Médio também é um grande vetor de consumo de ovinos. É uma estratégia que também está bem amarrada nesse contexto de reduzir riscos e aproveitar as oportunidades no mercado de exportação.
Mercado News – A Athena Foods foi um grande destaque para a companhia no terceiro trimestre. O que podemos esperar para a Athena Foods em 2022?
Danilo Cabrera – A Athena vai continuar sendo o nosso grande vetor de crescimento. Pelo fato de a Athena estar posicionada em vários países, a sua carteira de operação é muito mais ampla. Eu opero com carteira de clientes que buscam produtos no Paraguai, Uruguai, Argentina e na Colômbia.
Enquanto no Brasil, você tem essa restrição da localização geográfica só na operação brasileira. Então a Athena tem uma carteira de produtos e clientes mais ampla. Tem algumas fronteiras de crescimento e abertura de novos mercados.
Por exemplo a Colômbia, que é um mercado bastante recente nesse jogo do trade global de carne bovina. Então é um mercado que tem um rebanho bastante atrativo em um número bastante consolidado, com uma qualidade genética muito boa, só que ainda está engatinhando nesse jogo de conseguir ampliar sua base de exportação. A Colômbia é um vetor de crescimento bastante relevante em Athena. Uruguai e Argentina são dois produtores que chamamos de carne premium, porque capturaram market share [fatia de mercado], oportunidades em mercados mais premium. Capturam oportunidades sempre que você tem algum problema nos Estados Unidos e na Austrália que são outros produtores premiums. Athena te dá um leque de opções de crescimento mais diversificado do que uma operação só concentrada no Brasil.
Então devemos esperar nos próximos anos perspectivas bem positivas e cada vez mais positivas para Athena, que tem dentro de si mesma uma capacidade muito grande de diluir risco. Porque a própria Athena é composta por vários mercados então ela mesma tem capacidade de diluir o risco da sua operação.
Mercado News – Há um interesse futuro de retomar a abertura de capital da Athena?
Danilo Cabrera – A estratégia lá atrás quando da constituição de Athena foi sim uma oportunidade de utilizar Athena como um trigger para acelerar o nosso processo de desalavancagem. A Minerva desde a aquisição da Athena, dos ativos da JBS do Mercosul, se alavancou. Fez essa aquisição via dívida, teve um impacto dos investimentos e da desvalorização cambial. E viemos com um processo muito consistente de desalavancar a companhia por questões de estrutura de capital. A operação foi totalmente reorganizada, inclusive Athena, para ser mais eficiente com foco na exportação gerando muito caixa.
Além disso, também fizemos um trabalho muito grande do ponto de vista de equilibrar um pouco mais a estrutura de capital. Trazer mais equity para o jogo. Teve o aumento de capital privado em 2018 que tem reflexos até hoje. E uma das alternativas dentro desse processo era um IPO [oferta inicial de ações] de Athena para levantar equity adicional e reduzir a alavancagem. Por condições de mercado acabou não acontecendo, mas surgiu a oportunidade do follow-on da própria Minerva em janeiro de 2020. E endereçou essa equação. A equação fechou e eu consegui equilibrar a estrutura de capital e reduzir a alavancagem sem a necessidade dessa oferta de Athena.
Olhando sob a ótica da companhia, inclusive do investidor, é até positivo. Porque hoje eu tenho Athena em uma estrutura muito mais robusta, em um patamar de companhia muito mais atrativo se eu resolver ir ao mercado. Isto não está na mesa porque eu não tenho essa necessidade de me desalavancar. Já alcancei o equilíbrio. A companhia, o conselho, o management e os operadores da companhia têm o dever, caso surja qualquer tipo de iniciativa de abordagem, de avaliar o que faz mais sentido para o acionista ou não. Mas eu não tenho essa necessidade. Não tenho nenhum plano quanto a isso na mesa. Mas o mercado é dinâmico então eventualmente pode surgir alguma coisa.
Mercado News – Como a empresa vê a elevação de preços de commodities, que podem impactar os custos com insumos e afetar as margens da companhia?
Danilo Cabrera – Tem um ponto que temos que colocar que é o modelo de negócios de produção de carne bovina na América do Sul com o resto do mundo. Na América do Sul, esse modelo de negócios é essencialmente concentrado em pasto, cerca de 90% da produção. Então o impacto dos grãos, que é quando o animal vai para confinamento, é bastante reduzido. Não tem um impacto tão grande. Diferentemente de Estados Unidos, Europa, Austrália, que basicamente é um impacto direto, um para um. Tem impacto aqui na América do Sul, mas em uma escala menor.
O negócio do frigorífico normal é um business de spread. Eu compro o animal, pago o animal – que é 85% do meu custo – e vendo o produto final ao cliente. Minha rentabilidade vem desse spread. No caso da Minerva sendo um exportador, seu cliente está no mercado internacional que passa por um momento muito forte, bastante atrativo. Então a minha capacidade de repasse de preços, sob a ótica de qualquer movimentação do custo do animal, é quem define claramente qual vai ser a minha rentabilidade. O repasse de preços no mercado internacional tem sido bastante resiliente nos últimos anos.
O gado há dois, três anos saiu de R$ 150 a arroba, para ao redor R$ 300 agora. Ainda assim, as companhias exportadoras têm alcançado margens operacionais bastante atrativas. Isso é um indicativo claro de duas variáveis. Consolida esse racional de um business de spread. E principalmente a força da demanda do mercado internacional que tem permitido isso. A Minerva, player com foco na exportação, impactado por essa demanda do mercado internacional. Esse aumento no preço do gado tem seu impacto, mas um impacto muito mais reduzido no nosso caso com foco na exportação do que se você olhar para aqueles players que tem a concentração no mercado doméstico aqui na América do Sul.
Mercado News – A Rússia liberou a importação de mais duas plantas da Minerva. Como isso impacta a empresa?
Danilo Cabrera – Isso é só no Brasil. Já tínhamos plantas no Brasil que operavam a Rússia. Operamos a Rússia no Paraguai, por exemplo. Operamos a Rússia por muito tempo no Paraguai com bastante força.
O mercado de exportação funciona muito no spot, à vista. São raros os contratos de fornecimento de longo prazo. Então aumentar a sua carteira de clientes é flexibilidade e oportunidade de você buscar melhor rentabilidade e condicionamento do seu produto.
A Rússia é um mercado importante e de escala, tem um volume relevante. Então é mais uma alternativa. O cenário ótimo é o do Uruguai. Acho que é o único mercado da América do Sul que acessa todos os mercados globais. Então se a gente partir de um contexto que a oferta de carne é limitada e a demanda é mais forte do que isso, você acaba alocando sua produção naqueles mercados que vão ser mais atrativos e que vão te trazer mais rentabilidade. Abrir mercados, seja no Brasil, Argentina, Uruguai, Paraguai, Colômbia, é altamente importante para a gente porque traz essa flexibilidade de conseguir colocar o produto.
Mercado News – Podemos esperar boas perspectivas para 2022 com a demanda mais aquecida com a retomada econômica puxando o consumo de carne bovina?
Danilo Cabrera – Esperamos sim. Acho que não só a Minerva. O contexto global do mercado internacional de carne bovina tem perspectivas muito sólidas já há alguns anos e que devem continuar por um bom tempo. Partimos de um ponto em que a oferta não tem crescido na mesma velocidade da demanda. Demanda por carne bovina é função de renda, urbanização. Você está na cidade, tem acesso mais facilitado à carne bovina. Função principalmente de Ásia e Oriente Médio de padrão ocidental de consumo. Nós no Ocidente estamos mais acostumados a comer carne bovina com mais frequência. Isso é algo que está começando a ser desenvolvido nessas regiões.
Então quando olhamos para esse contexto, o grande vetor de crescimento do mundo hoje é a Ásia. Migração das populações rurais da Ásia e Oriente Médio para os centros urbanos. A demanda por carne bovina tem crescido em uma velocidade que a oferta não acompanha. Esse cenário de exportação tem se favorecido bastante ao longo dos últimos anos e isso vai continuar por muito tempo. Se fizermos uma análise do consumo per capita, média global ou fazer uma média global excluindo a Ásia, você vai ver uma diferença brutal. Boa parte do mundo na média consome acima de dois dígitos de quilo de carne bovina per capita no ano. A China, por exemplo, consome ao redor de três, quatro, cinco quilos per capita. Outros países consomem muito menos. Você repara que tem uma capacidade de crescimento muito forte.
Então estamos bastante confortáveis no cenário dos próximos anos olhando para o mercado, porque a demanda vai continuar crescendo de maneira muito forte e muito rápida. A oferta vai seguir em uma trajetória de crescimento bastante limitada porque produzir carne bovina, essencialmente a produção do animal, não é simples. Você precisa de uma série de fatores de produção que não são facilmente encontrados em qualquer lugar do mundo.
O mundo passa por uma série de problemas hídricos, a Austrália está sofrendo com isso. Mão de obra tem um impacto no custo de produção. Produzir gado na Europa, nos Estados Unidos e na Austrália é caro. Terra também é caro na maioria dessas regiões. Você tem muitas regiões que não se alcançam condições climáticas adequadas. Então além da dificuldade em escalar a produção, você tem a dificuldade da matriz de custo.
A América do Sul é extremamente competitiva porque ela tem recursos hídricos abundantes, terras ainda abundantes e mão de obra abundante. Mão de obra dentro de uma estrutura de custo muito barata. Então é uma situação em que você consegue escalar a produção ainda de maneira muito eficiente. A América do Sul hoje tem, basicamente, 40%, 45% do comércio internacional de carne bovina. Se olharmos cinco, seis anos atrás, isso estava próximo de 30%.
Para o mundo faz muito sentido a matriz de produção de carne bovina se concentrar na América do Sul, até ambientalmente. Produzir a pasto é muito mais benéfico do ponto de vista ambiental do que produzir via confinamento.
Mercado News – Qual o principal objetivo da companhia para o ano que vem?
Danilo Cabrera – Vamos continuar mantendo nosso foco estratégico em bovinos, no mercado de exportação. Procurar ampliar cada vez mais o nosso leque de clientes nas regiões onde operamos. O mercado doméstico também é relevante. Tenho 75% da minha operação, mas ao redor de 25% para o mercado doméstico que é bem relevante também. Então trabalhar nesse cenário de incerteza política, inflação, mas o grande foco é continuar produzindo e entregando para os nossos clientes o produto Minerva que ele já conhece a qualidade e principalmente procedência.
Olhando para dentro da companhia, manter a nossa postura de ter um balanço bastante equilibrado, uma operação bastante eficiente com nível de rentabilidade que tem se mantido bastante estável a despeito da volatilidade do mercado nos últimos anos. A companhia equilibrou muito a sua estrutura de capital de modo que acabou gerando muito retorno para o acionista na forma de dividendos, coisa que não é comum na nossa indústria e não é tão comum dentro do histórico da Minerva.
Então olhando para 2022 deve ser um cenário em que deve se manter uma postura de disciplina de capital bastante conservadora por conta dessa volatilidade que deve continuar a acontecer ao longo do ano, mantendo resiliência na nossa capacidade de pagar dividendos e gerar valor para o acionista. Com o mercado internacional muito forte, mantendo uma rentabilidade operacional bastante resiliente com o balanço equilibrado. Naturalmente um dos usos de alocação de capital que claramente vai saltar aos olhos é gerar valor para o acionista, seja na forma de recompra, distribuição de dividendos ou qualquer outro tipo de provento.
Temos nosso plano de expansão. Austrália foi um caso clássico, mas ele vai ser sempre bem cauteloso, de uma maneira bastante disciplinada e você não vai ver a companhia estressar estrutura de capital de maneira abrupta de um período para o outro. Hoje é um cenário muito mais cauteloso e conservador. Essa é uma indústria que sempre foi muito marcada pela consolidação lá atrás. O nome do jogo para a Minerva – não posso dizer para os outros players – é um pouco diferente. Já temos o nosso footprint operacional estratégico muito bem consolidado. Agora é aperfeiçoar isso ainda mais, como por exemplo a questão da Austrália, mas sempre de maneira bem cautelosa que não impacte a estrutura de capital.
Mercado News – Para o senhor qual foi o grande destaque do terceiro trimestre? E o que podemos esperar que continue no quarto trimestre?
Danilo Cabrera – Um destaque do trimestre foi a resiliência operacional, de rentabilidade mesmo em função do impacto da ausência da China aqui no Brasil. Ali se mostrou a correção da nossa estratégia de diversificação geográfica, no surgimento da dificuldade conseguimos endereçar esse problema em função dessa estratégia.
Mostrou também o grande momento do mercado internacional que mesmo com a ausência da China você teve uma rentabilidade especialmente em Athena muito forte e atrativa. Então sob a ótica do acionista, mesmo diante desses fatos, conseguimos manter a estrutura de capital equilibrada, com alavancagem equilibrada, com geração de caixa positiva, resultado líquido positivo. Isso criou esse cenário que a gente vem construindo há algum tempo de conseguir pagar dividendos, conseguir distribuir dividendos. Foi o que aconteceu agora recentemente.
O quarto trimestre é um trimestre em que o cenário de exportação segue firme, atrativo. Preços no mercado internacional seguem bastante firmes.
Então eu continuo com a estratégia de redirecionamento. No começo do trimestre o gado estava em um patamar de preço aqui no Brasil mais baixo do que evidenciou. Agora por efeito sazonal ele subiu um pouco, então isso acaba trazendo um pouco mais de compressão de rentabilidade. Mas você não deve esperar um trimestre muito diferente do que vimos agora nesse terceiro. É um trimestre que deve seguir muito com essa tônica que a companhia tem apresentado, mas principalmente o mercado de exportação tem sinalizado ao longo dos últimos anos. O mercado de exportação forte com uma demanda por carne bovina bastante forte, especialmente da Ásia e do Oriente Médio.
Recentemente o mercado americano também vem um uma demanda muito forte. É um mercado bem atrativo porque paga bem. É um mercado premium. Então para os exportadores aqui da América do Sul é um trimestre que deve ser muito semelhante à dinâmica dos anteriores. Foco na exportação com um nível de rentabilidade bastante resiliente em linha com o que temos apresentado.
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